Procurando objetos astronômicos: das estrelas às galáxias

24 de novembro de 2015

Oscar Kudo – Professor de Física
Michael Santos – Professor de História

O tamanho de nossa solidão

Sempre que tocamos ou nos deparamos com qualquer tema, assunto ou atividade que digam respeito a quaisquer fragmentos ou aspectos do universo celeste surge, quase que inevitavelmente, perguntas a respeito da existência de vida, fora da Terra. Somos tomados por inquietações e questionamentos. Será que estamos sozinhos e perdidos nesse universo sem fim? Qual é o nosso lugar e o nosso papel nessa odisseia cósmica? O que estamos fazendo aqui e para onde vamos? São perguntas recorrentes complexas e inquietantes que fazemos desde que tomamos consciência de nossa humanidade e que revelam a nossa impotência, incompreensão e perplexidade frente a questões ancestrais de nossa existência.

Carl Sagan, astrofísico e escritor de divulgação científica americano, mais do que ninguém, traduziu este estado de perplexidade com a seguinte frase: O que é mais assustador? A ideia de extraterrestres em mundos estranhos, ou a ideia de que, em todo este imenso universo, nós estamos sozinhos? E, concluiu: Se não existe vida fora da Terra, então o universo é um grande desperdício de espaço”

Telescópio SOAR: o fotógrafo do hemisfério sul celeste

O trabalho de astronomia que propusemos aos alunos do ensino médio e dos 9ºs anos do Centro Educacional Pioneiro, mesmo sendo um trabalho limitado e centrado em noções básicas dos fenômenos celestes suscitou inquietações e perguntas que mexeram com a cabeça dos alunos à medida que eles foram instados a percorrerem estrelas, galáxias, aglomerados e nebulosas para dar conta do Concurso de Astronomia-2015, promovido pela OBA (Olimpíada Brasileira de Astronomia) e LNA (Laboratório Nacional de Astrofísica) com abrangência nacional. O concurso propôs vários desafios baseados em determinadas regras e parâmetros para que os alunos redigissem uma dissertação sobre um objeto astronômico, a ser submetida a uma comissão julgadora composta por um grupo de astrônomos profissionais de diversas instituições de ensino e pesquisa, do país. O objeto astronômico escolhido será fotografado, posteriormente, pelo telescópio SOAR (Southern Astrophysical Research Telescope) projetado para produzir imagens de qualidade melhor que as de qualquer outro observatório do mundo em sua categoria. O telescópio foi financiado por um consórcio com os seguintes parceiros: Brasil (representado pelo CNPq – Conselho Nacional de Pesquisa), o National Optical Astronomy Observatory (NOAO), a Universidade da Carolina do Norte (UNC) e a Universidade Estadual de Michigan (MSU) todas instituições americanas. O Brasil é o sócio majoritário do projeto, tendo arcado com cerca de 30 milhões de dólares (34%) do custo total de sua construção e montagem. Ele está situado em Cerro Pachón, uma montanha dos Andes Chilenos, com altitude de 2.700 metros, acima do nível do mar.

A formação de duplas para boas pesquisas e bons argumentos

A redação poderia ser escrita individualmente ou em dupla. Sugerimos aos alunos que trabalhassem em dupla para que pudessem interagir e potencializar os resultados do trabalho. Organizamos as duplas e iniciamos o encaminhamento com o foco do trabalho voltado, claramente, para a escolha do objeto astronômico para que, em seguida, as duplas pudessem partir para a pesquisa e, finalmente, a redação do texto. A escolha do objeto, como já prevíamos, não foi tão fácil e rápida porque, cada dupla, para chegar a ele teve que contornar vários obstáculos.

É lógico que a premiação chamou a atenção e animou os alunos. O(s) vencedores da redação do ensino médio farão uma visita às instalações do Telescópio SOAR no Chile (entre fevereiro e abril de 2016) e do ensino fundamental II visitará às instalações do LNA em Itajubá, MG, e ao Observatório do Pico dos Dias em Brazópolis, MG (entre março e junho de 2016). Além disso a escola receberá um quadro com a imagem digital de alta resolução impressa (tamanho aproximado 50 x 50 cm), feita com o Telescópio SOAR, por astrônomos profissionais e receberão a visita de um astrônomo do LNA, que irá proferir uma palestra sobre esta instituição de pesquisa, o Telescópio SOAR e o objeto astronômico da redação vencedora.

Contornando as restrições e enquadrando os objetos astronômicos

Como os objetos serão observados pelo telescópio SOAR, entre fevereiro e maio, algumas restrições para escolha deles foram impostas. A ascensão reta deveria ficar no intervalo de: 3h00  AR  19h00 e a declinação entre: – 60° < DEC < 0° (declinação negativa porque o SOAR encontra-se no hemisfério Sul Celeste). Além dessas restrições mais duas deveriam ser respeitadas: a magnitude deveria ser menor que: V < 12, pois o tempo de observação do objeto é de até uma hora e, por isso, o seu brilho não pode ser muito fraco. Só para esclarecer, em astronomia adota-se para efeito de comparação do brilho dos corpos celestes a magnitude aparente, concebido pelo astrônomo grego Hiparco, há mais de 2.000 anos. Ele propôs que as os corpos celestes mais brilhantes tivessem o menor valor na escala de magnitude. Então as estrelas mais brilhantes deveriam ter o menor valor: magnitude 1 Para obtenção da imagem, o telescópio usará um imageador (Goodman) que pode produzir imagens de 7,2 minutos de arco de diâmetro. Para se ter uma ideia, cinco minutos de arco é, aproximadamente, um sexto do diâmetro da Lua cheia e cobre uma área muito maior do que as câmeras do Telescópio Espacial Hubble, por exemplo. Constelações e grandes aglomerados de estrelas cobrem áreas, ainda, maiores do céu. Então, se por um lado o Hubble é excelente para identificar detalhes em pequenas escalas, o imageador Goodman, do SOAR, permite a visualização de objetos astronômicos em uma escala maior. Por isso, o objeto para o concurso deveria ter um diâmetro máximo aparente de 7 minutos de arco.

Para conseguirmos o tamanho do objeto lançamos mão do SIMBAD (Set of Identifications, Measurements, and Bibliography for Astronomica Data, traduzido para o português como Conjunto de Identificações, Medidas e Bibliografia para Dados Astronômicos). É um banco de dados astronômico de objetos que se situam, além do sistema solar e são mantidos pelo Centre de Données astronomiques de Strasbourg (CDS, traduzido como Centro de dados astronômicos de Estrasburgo), na França. Essa etapa foi demorada e trabalhosa.

Para que tais restrições fossem compreendidas e contornadas os alunos tiveram que entender uma série de noções básicas de astronomia. Desde o início nos preocupamos em passar a todos eles os conceitos básicos e sempre que necessário, ao longo do trabalho, parávamos para explicar, discutir e estabelecer as relações entre as áreas de conhecimentos envolvidas para que eles pudessem incorporá-los aos seus repertórios teóricos. Um trabalho desse tipo sempre traz aportes importantes porque obriga a todos relacionarem ideias, conceitos e fatos dando ao conhecimento uma dimensão mais integrada, mais rica e coesa, ou seja, mais interdisciplinar à medida que noções de física, astronomia, geografia, história e redação iam sendo trabalhados, simultaneamente. Tiraram, ainda, muitas lições de como organizar o trabalho, dividir as tarefas e cumprir prazos para dar conta dos desafios.

A participação dos alunos e os resultados obtidos

Com o concurso pudemos destacar alguns aspectos das atividades dos astrônomos e astrofísicos e algumas pesquisas de ponta desenvolvidas por grupos de cientistas brasileiros que nada tem a dever a grupos de pesquisas dos países mais desenvolvidos. Com o telescópio SOAR os novos grupos de pesquisa receberão um enorme impulso garantindo a continuidade e o crescimento de nossa astronomia que, nos últimos anos, tem sido de uma taxa de cerca de 10% ao ano.

Tivemos que correr contra o tempo pois muitos outros acontecimentos e atividades atravessaram a vida dos alunos, nesse período, diminuindo bastante o tempo disponível para que pudessem fazer a escolha e desenvolver a pesquisa dos objetos astronômicos. Mesmo assim todas as duplas do EM e a maioria das dos 9ºs anos conseguiram elaborar a redação e enviar, a tempo, à comissão julgadora.

É claro que nem tudo foi fácil e automático no encaminhamento do trabalho. Inicialmente muitos alunos dos 9ºs anos não se mostraram interessados em participar. Tentamos convencê-los, porém não fomos muito bem sucedidos. Foi o envolvimento dos outros alunos e o desenvolvimento do próprio trabalho que fizeram muitos deles se interessarem e se envolverem no concurso. O importante é que a maioria acabou participando, aderindo ao trabalho e muitos alunos, inclusive, se entusiasmaram com a escolha e a pesquisa do objeto astronômico e redigiram boas redações.

É torcer e esperar pra ver!

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